Muitas pessoas consideram o piercing um acessório para ser usado no dia-a-dia, assim como brincos, anéis, pulseiras e colares. No entanto, mais do que um acessório, o piercing tem vários significados. Povos ancestrais, como os Maias, utilizavam este adorno na boca em ritos de passagem. Ainda hoje, índios das mais diversas etnias também utilizam objetos pequenos em várias partes do corpo para diferenciarem-se das demais tribos. Os jovens da sociedade moderna, entretanto, utilizam o adereço, principalmente na língua, nos lábios e na bochecha, como forma de manifestação da moda vigente ou, então, para identificar quem é da sua “tribo”. O que eles não sabem é que a utilização do piercing na região bucal pode trazer sérios riscos à saúde e, até mesmo, o aparecimento do câncer bucal.
Segundo a cirurgiã-dentista Caroline Jorge Zarvos, há várias conseqüências para o usuário do piercing, como dentes quebrados ou lascados, gengivas inflamadas ou irritadas, mucosas e palato feridos, interferência na mastigação e deglutição, dificuldades na fala, além de possíveis reações alérgicas. Podem acontecer também a perda do paladar e a ocorrência de infecções, pois a boca contém inúmeras bactérias. Em casos extremos, a língua incha muito e pode obstruir as vias aéreas. Ela também alerta para os casos em que as peças são engolidas.
“Uma vez atendi uma paciente que precisou fazer uma cirurgia para retirar o piercing do estômago. Quando ela usava a jóia, tinha o hábito de ficar brincando com a peça na boca e acabou engolindo. Nunca mais ela quis saber de piercing ou qualquer outro objeto estranho na boca ou no corpo”, lembra a Dra. Caroline, que também é especialista em odontopediatria. Todo material diferente, quando é colocado no corpo, pode levar o organismo a adaptações que podem ser danosas para o indivíduo.
Quem usa piercing na língua sabe que a dor e o inchaço são as primeiras complicações que surgem. Pode acontecer de a perfuração atingir regiões vascularizadas ou nervosas, provocando sangramentos prolongados ou parestesia (sensações de frio, calor e formigamento). Além de tudo isso, a dificuldade de higienização do local onde repousa a jóia torna-o um foco de infecção que pode ocasionar, além da perda da peça, infecções generalizadas no indivíduo. Portanto, uma eficiente higiene bucal e, inclusive, do piercing devem ser realizadas com muita atenção e paciência, pois é praticamente certo que, depois de um determinado tempo, o indivíduo apresente algum dano nos tecidos da boca levando à perda precoce de dentes. Junta-se a isso que o hábito do consumo de álcool e do fumo ou a disposição genética podem levar ao câncer.
“É essencial que o usuário do piercing faça um acompanhamento com um cirurgião-dentista para avaliar as condições de higiene. Caso o paciente já apresente algum problema decorrente do uso da peça, é recomendável que ela seja retirada imediatamente. Somente profissionais da saúde estão habilitados a prescrever antibióticos na fase pós-operatória ou no desenvolvimento de alguma infecção por falta de precaução”, adverte a Dra. Caroline.
Apesar de todas as advertências e informações a respeito dos danos causados à boca, as pessoas acabam deixando-se influenciar pela moda ou pela estética e fazem o procedimento para usar o piercing na boca sem nenhum medo. Neste caso, é preciso ficar atento ao estabelecimento e à qualificação de quem executará o serviço. Nem sempre os estabelecimentos que colocam as peças seguem as normas da Vigilância Sanitária quanto aos quesitos de assepsia e de esterilização dos materiais. Muito menos aqueles que fazem a intervenção na boca, pois sequer têm a profissão reconhecida. A falta de cuidados com a biossegurança favorece a transmissão de hepatite e de Aids.
O tamanho da peça e a qualidade do material que será utilizado também têm influência direta, pois a boca é muito sensível e qualquer alteração no meio bucal pode causar, além do incômodo, problemas a curto, médio e longo prazos. No período de cicatrização que vai de quatro a cinco semanas, para a língua e os lábios, respectivamente, é necessário redobrar a atenção para evitar a contaminação e infecção do local. Nessa fase, o usuário do piercing deverá evitar levar à boca alimentos apimentados e ácidos, sem esquecer de utilizar antissépticos bucais toda vez que se alimentar. Sem contar que os beijos nunca mais serão os mesmos.